domingo, 11 de janeiro de 2009

A ENCHENTE

(poema de Alcides Buss)

Estavam todos ali.
As casas tinham jardins
e, nos jardins, insetos e pássaros
teciam os dias azuis.

Bem perto, o rio
levava as tardes, exaustas,
e trazia as manhãs
repletas de tudo que vai
nos bornais de cada um.

Das casas e do rio
honravam-se as crianças e seus pais,
os parentes e amigos,
a tribo, enfim, do dia-a-dia
moderno e secular.

No cotidiano servir
não cabia vislumbrar a sina cíclica
sob a túnica do céu.
Preciso era desnudar os deuses
e aí, sim, buscar esse saber
que desconstrói o sonho
para, em novo patamar,
refazê-lo mais próximo
das humanas serventias.

Que a ira lá do céu
tão forte fosse desabar
na cabeça dos mortais,
isso ninguém pensava
até bem pouco, nos dias
que, rápidos, se vão.

De tal forma caiu
que rasgou a tessitura
do verde com o chão;
rasurou a geografia;
as entranhas domésticas
turvou e, das dores a maior,
ceifou de muitos o cordão da vida.

Perguntam-se as almas espontâneas
se merecida era tal desdita.
A resposta que ganham
é um fio de voz
no aparato das ajudas, bem-vindas,
incapazes, porém,
de fazer voltar a vida
ao que era até então.

Alcides Buss é um dos mais queridos poetas de SC. Publicou mais de dez livros de poesia. Criador dos varais literários e do Movimento de Ação do Livro: o Livro em Movimentção.

Um comentário:

PensarFalar disse...

Adorei! VOu procurar o livro desse autor! Por favor visete meu blog... sou novata na área!!