quinta-feira, 19 de abril de 2007

Riscado

Criei
um
blog
e me sinto uma imbecil

a impressão
(não impressa em papel)
de que ninguém me lê

aquele blog na prateleira
dos esquecidos

uma amiga, compadecida:
visite outros blogs e deixe um recado

deixei riscado:
o meu tempo se esgotou

segunda-feira, 16 de abril de 2007

A carta e o livro (crônica)

Alguém se lembra da primeira carta que recebeu? Houve um tempo em que aguardava ansiosa a chegada do carteiro. Ah, aquelas cartas escritas a mão, de amigos enviando poemas, parentes mandando notícias, ou as cartas de amor (quem nunca beijou uma carta, enviada ou recebida?). Alguns minutos para olhar o exterior do envelope, os selos, a letra, os carimbos. Carta do outro lado do mundo e a quase inveja daquela que viajara mais que eu. Depois me ensinaram a escrever no envelope “via aérea”, diziam que chegava mais rápido. Preferia que minha carta viajasse de navio e espiasse o azul do mar, isso sim.

E do telegrama, alguém se lembra? As palavras reduzidíssimas, pois custava caro. Recebi poucos. Telegramas me faziam tremer. Havia um receio de não os compreender por causa das abreviações e omissões, ou de que enunciassem notícias ruins. Uma professora tentava me ensinar a escrever telegramas, foi quando compramos o telefone: “Alô, como vai? Eu vou indo e você, tudo bem?”.

Agora as cartas são enviadas instantaneamente pelo computador por meio da internet. Se não responder logo, não dá para dizer que foi culpa do navio, da guerra, do avião que caiu ou da ineficiência dos correios. Mesmo assim, as desculpas persistem: “Desculpe, estava sem provedor; meu computador estava quebrado; minha caixa-postal está com problemas”. As mentiras são as mesmas, só trocam de roupagem. Talvez o que tenha mudado é o hábito de escrever e a própria linguagem, agora rápida e eficiente.

Discussão antiga é a do desaparecimento do livro. Dizem que esse livro de papel com folhas costuradas, capa e lombada está com os dias contados. Tudo indica que sim. No entanto, assim como as cartas escritas a mão nos acompanham até hoje, creio, com o livro ocorrerá o mesmo. Será uma mudança gradativa. E eu não vou ficar de fora do novo que chega. Resta saber como serão pagos os direitos autorais.

Não sei se o meu próximo livro será de papel. Vontade eu tenho é de publicar um de seda, feito os chineses de antigamente. Chique, não? Antes da seda, a China utilizava a madeira para registrar o conhecimento, até que um imperador resolveu destruir todos os livros. O seu sucessor tentou recuperá-los, mas não havia madeira em quantidade suficiente, foi então que passaram a utilizar a seda e, bem mais tarde, inventaram o papel.

Gosto de ter o livro em mãos, levar alguns na mala quando viajo, ler na praia. Na última ida ao litoral, impressionou-me a quantidade de pessoas lendo. Os livros também deixam a praia bonita: areia, mar, ondas, pessoas, conchas e livros. Livro também serve para se guardar coisinhas. Na prosa de Guimarães Rosa encontramos estes versos: “Entre as folhas/de um livro de reza/um amor-perfeito cai”.

Talvez um dia eu me lembre disso como algo do meu tempo. Explicaremos às novas gerações como tudo funcionava. Mas será que eles terão tempo para nos ouvir?

In: Caderno Anexo (Jornal A Notícia - 16/04/2007)

segunda-feira, 9 de abril de 2007

Quintal (Crônica)

Cadê o menino? Está brincando no quintal. Joga bola contra o muro. E a filha? Também no quintal, pendurando roupas no varal. Vovó? Bordando. Letícia? Lendo.
Quintal é lugar de avencas, tanque de pedra, sombra, parreira de uvas, pé de goiaba. Quintal é lugar de muitas coisas; é aquele espaço entre a casa e a rua, nos fundos, entre os muros. Também é um lugar onde se faz e se não faz, se pensa e se repensa, se olha para nuvens, se alcança uma estrela, se brinca, cresce, se espelha. Espaço para correr, pular, descobrir, guardar bicicletas ou coisas sem serventia, soltar o pensamento feito pipa, na divagação e no vento, respirar lento. O quintal é um espaço privado, diferentemente da rua, porém não é fechado, feito a casa. Saboroso, porque alimenta com frutas e horta; colorido, porque a céu aberto; perfumado, porque floresce e enverdece. Todo quintal tem som e ritmo próprio, de acordo com os que o habitam. As pessoas, a rua, a casa, as árvores, as folhas, o vento, a chuva, o cheiro, os pardais, tudo isso tempera um quintal.
Quintal é lugar de conversa, fofoca, namoro, legumes, plantas, lazer, música, comida. Para deitar na rede, esmorecer, cultivar laranjas e limões, lavar roupas, pisar na grama, olhar formigas, jogar o tempo fora. Apropriado para as tralhas que não cabem na casa, para o pessegueiro florir, para de repente receber a visita de beija-flores, para um canteiro de flores, para momentos de amores. Para semear temperos. E se ao jogar semente fora, nascer um pé de planta corredeira, deixe-a crescer e tomar forma, a dádiva da natureza, sem muita demora, de uma simples flor amarela, nascerá uma abóbora. Ensina o dicionário que a palavra “quintal” quer dizer pequena quinta, ou terreno, geralmente com jardim ou horta, atrás de casa.
Se houver um banco sob o pé de goiaba, ou sob a parreira de uva, ou ainda, sob uma buganvília florida, será lá, que no meio da tarde de um dia comum ou de fim de semana se observa um por de sol, aspira o perfume do jasmim, o cheiro das roupas limpas no varal, a leitura de um livro ou jornal, um papo com o vizinho, limonada entre amigos ou, quem sabe, o almoço de domingo.
Em Brusque, o mais novo e delicioso espaço é o restaurante Quintal. Fica na Rua Azambuja. Lá você saboreia arte e almoço natural, podendo visitar a horta, de onde são colhidos os produtos utilizados no preparo das refeições. Tudo orgânico, dentro das normas da saúde plena e do sabor autêntico, com direito a música seletiva e um bom papo sobre alimentação com os proprietários. Espaço para exposições de arte, lançamento de livros, performances... A exposição atual apresenta algumas das primorosas ilustrações para livros infantis da artista Márcia Cardeal (do livro Pomar de Palavras / Alcides Buss, Casa Amorosa / Inês Mafra, dentre outros)... Enfim, um lugar que alimenta corpo e alma.
In: Caderno Anexo (Jornal a Notícia - 09/04/2007)

quarta-feira, 4 de abril de 2007

Lembranças (crônica)

Pai,

Insônia. A Páscoa chegando e a tua lembrança.

Eu te pediria desculpas pela minha preguiça em rezar ou acompanhar a procissão, minha cara feia ao teu lado durante a missa, meus passos automáticos, vacilantes. A pipoca como se fosse pouca, a água da gruta como se não fosse fresca e os deuses como se fossem ocos. Eu te pediria desculpas. E te pediria: fique para mais uma Páscoa, apenas uma. Eu na minha bicicleta, tentando pedalar no teu ritmo, observava o teu silêncio e o teu esforço em chegar, cumprir o ritual de domingo.

Eu te pediria tempo. Faria tudo do começo e novo. Prepararia a terra para o amendoim. Escolheria as melhores sementes. Saberia o tempo de colher, depois lavar, deixar secar ao sol. Desprendê-los, descascá-los. Faria tudo isso sorrindo de contentamento. Como nunca o fizera. Não me importaria com o sol ou com a chuva, nem com a roupa suja e as unhas estragadas. O suor na cara e a lide não me assustariam, ao contrário, seriam o tempero da vida.

Depositaria na quarta (caixa de madeira) o amendoim que seria debulhado para fazer as amêndoas. Ajudaria a guardar as casquinhas de ovos ao longo do ano com o máximo de cuidado, para depois pintá-las ou decorá-las com papel de seda ou crepom. Inventaria coisas novas: coelhos, galinhas, ratinhos e cartuchos para uma Páscoa feliz. Seria a primeira a querer aprender o ponto do açúcar, o momento exato de retirar do fogo o amendoim transformado em amêndoa e aprenderia todos os tipos, a de cobertura branca, chocolate, ou moída.

E não me importaria de acompanhá-lo na procissão ou no lava-pés. Seguiria à frente da multidão com uma vela acesa. Terias orgulho de mim. Não perderia o meu olhar no infinito, na nuvem, ou nos pardais. Prenderia meu olhar no Cristo à frente, no padre vestido de roupas bordadas e no ritmo de teus passos, pois para cada um teu, precisaria de dois meus. Tudo isso eu saberia. E não me cansaria.

Também não esmoreceria diante da quantidade de afazeres. Não reclamaria dos calos nas mãos, nem por deixar a brincadeira para depois. Seguiria na frente em busca de cebolinha vermelha para tingir os ovos de Sexta-feira Santa que seriam cozidos. Pai, você não imagina, hoje não se encontram ovos, nem galinhas, as casas são quadradas, as cozinhas diminuíram e não se usa chapéu, nem sombrinha, apesar do sol!

Tudo foi perdendo a graça. Compra-se pronto no supermercado. Lembra, pai, daquela Páscoa que não encontrei minha cesta? Então tu, comovido diante de minha tristeza (era a única a não encontrá-la), me pediste para buscar banana nos fundos da casa, e eu fui. E lá, entre os cachos de banana, encontrei uma cesta repleta de ovos. Sequei as lágrimas do rosto e fui almoçar (após a oração, claro). Estavam todos à mesa, felizes? Sim, completamente, algo que não existe mais, que não se repete.

In: Caderno Anexo (Jornal A Notícia, 02/04/2007)

segunda-feira, 2 de abril de 2007

Borboletras (agenda)

na terça (03/04), às 16:30 horas, estarei autografando o Borboletras na Feira do Livro de Joinville, no stand da Ed. da UFSC. Se tudo der certo, ficarei para a Palestra com o Arnaldo Antunes.

na quarta (04/04), a sessão de autógrafos é no Espaço Quintal. Um evento coletivo com as belas ilustrações de Marcia Cardeal e Luciano Mafra. Apresentação da performance "Casulo" da Cia Teatral Eu, tu, Elas. Tudo isso no Quintal, a partir das 20:30 horas. Imperdível!