O mesmo raciocínio leva as bibliotecas a não emprestarem enciclopédias e bibliografias. Além da consulta rápida há outros motivos que levam uma obra a não sair para empréstimo, cito alguns: obras esgotadas da qual a biblioteca disponha de um único exemplar, obras raras, as muito solicitadas para pesquisa (como as didáticas), obras seriadas, coleções etc
No setor infanto-juvenil da biblioteca em que trabalho, todas as obras são de empréstimo, exceto uma. Trata-se de um livrão (livro grande) infantil, medindo cerca de 80 cm de altura, com uma história que nem é famosa, nem tão boa, mas que toca o coração dos pequenos por motivos que não sabemos. O livro, intitulado "O Maior Livro em Relevo Já Publicado" (Richard Scarry), foi comprado há anos de um desses vendedores de porta em porta. Na época, custou algo em torno de R$ 10.
Fato é que as crianças o adoram. E de tanto adorar e manusear, o livro já recebeu algumas restaurações improvisadas na própria biblioteca. Eu mesma já colei alguns pedaços soltos, pois se trata de livro interativo, no qual podem manusear personagens e outras peças.
Quando o compramos, decidimos que o livro seria um chamariz para as crianças in loco, portanto, não seria de empréstimo. Talvez por isso o livro ainda exista. Livros infantis normalmente têm durabilidade menor que os de adulto, mas, o que nos deixa feliz é proporcionar a aproximação entre a criança e a viagem da leitura.
Presenciei algumas cenas de crianças chegando ao balcão de empréstimo querendo levar o "livrão". Ao explicarmos que não era permitido, elas se conformavam e acabavam pegando outro. Semana passada, aconteceu algo inusitado.
Por volta das quatro da tarde notei pai e filho num impasse: o filho corria na frente levando nos braços algo quase maior que ele, o pai atrás, tentava dissuadi-lo. Ao me aproximar percebi um menino de não mais que três anos, já com duas lágrimas na face, abraçado ao objeto.
- O que foi? Perguntei.
O pai explicou:
- Ele quer, por toda força, levar este livro que não é de empréstimo.
Disfarcei a alegria que a história me causava e conversei com o garotinho. Disse que também achava o livro muito bonito e que o compreendia. Mas expliquei que, mais tarde, outro menino e mais outro, viriam à biblioteca e ficariam tristes ao constatar que o livro não estava ali.
Após me ouvir com olhar compenetrado, permitiu que o pai guardasse o imenso objeto. Ao sair da biblioteca, estava alegre e saltitante, como se nada acontecera.
Talvez devêssemos comprar outro exemplar. Claro, desde que os pais se comprometam a ajudar no transporte. Afinal, o livro é grande demais para que os braços pequenos o abracem, durante o longo percurso entre a biblioteca e as casas.