segunda-feira, 28 de maio de 2007

Dia de nada

Hoje não é dia de nada. Como assim? Explico: a minha agenda apresenta todo início de mês uma lista das datas comemorativas. Já são tantas, que poucos dias do nosso calendário escapam a elas. Por exemplo, neste mês de maio, dentre outras, tivemos o Dia das Mães (sempre no segundo domingo do mês) e o dia do silêncio. Eu particularmente me afeiçoei a este último, só não entendi direito como comemorar, ou seja, sei muito bem como fazer silêncio, mas não entendi o que pretendiam os que o inventaram (ou instituíram). Sim, devemos pensar um pouco em vez de aceitar tudo tacitamente. Já que hoje não é dia de nada, talvez nos sobre tempo para isso: pensar em silêncio.

Já que hoje não é dia de nada, que tal inventarmos alguma coisa? Não, por favor, nada de comemorações efusivas, nada de corre-corre às lojas, invente uma data pessoal, uma data que envolva apenas você e as pessoas de seu convívio. Por exemplo: hoje é dia de comer apenas frutas, ou apenas verduras, ou dia de observar pássaros, ou de plantar flores, ou de visitar sebos, ou de não fazer nada além do necessário.

Outra idéia é desmarcar os compromissos. Como assim, cancelar? Sim, todos. Mas hoje é segunda-feira. Sim, eu sei. Cada um sabe de si. Refiro-me aqueles compromissos anotados em nosso pensamento. Compromissos que podem ser adiados sem afetar os outros, como o de assistir uma novela ou ao jornal na TV.

Saber que hoje não é dia de nada me deixa feliz. Ninguém vai me cobrar por ter esquecido de cumprimentar alguém. Também não serei convidada a nenhum jantar em prol de certas categorias que costumam acontecer nestas datas. E, o mais importante, um dia que ninguém ainda nomeou como sendo disto ou daquilo, chega com mais frescor. Se alguém perguntar ao leitor que dia é hoje, diga que é dia de muitas possibilidades, um dos que sobrou de nosso calendário abarrotado de comemorações, inclusive, em maio tivemos o dia do café, que não foi comemorado sozinho, dividiu espaço com o dia do vestibulando e o dia do datilógrafo (pausa para um café).

Após o café, voltamos revigorados. Que ninguém venha nos dizer que existe um santo para todos os dias ou um dia para todos os santos, não queremos saber, queremos apenas ser o que somos dentro deste espaço de tempo sagrado entre duas noites. E que este dia não passe rápido como os feriados, nem lento como os dias chatos. Que haja alegria no ar, sorriso nas faces, esperança, cordialidade, leveza... Eu sei que o Brasil (por que fui me lembrar disso?) está atolado de problemas e nós de impostos. E que nada parece ter solução. Se assim fosse, eu diria: o que não tem remédio, remediado está. Mas tem remédio, sim. E o remédio somos nós. Precisamos ler não apenas para nos informar, mas para pensar (e agir!). As vozes dos outros serão distinguidas pelo nosso pensamento laborioso e silencioso: acorde.

Publicada no Caderno Anexo (Jornal A Notícia - 28/05/2007)

terça-feira, 15 de maio de 2007

Apelo

Deixem tudo como está
cada árvore no seu lugar
não mexam, por favor,
neste buquê de abelhas
nem derrubem a casa velha

Deixem-me onde estou
com meu silêncio benfazejo,
please,
não me solicitem o sol

Tanto tento ficar invisível
um sopro esvoaçante para longe
de tudo que me concretiza os olhos

segunda-feira, 14 de maio de 2007

Casa e cozinha (Crônica)

Até a mais modesta habitação,
vista intimamente, é bela.
Bachelard


Quem arduamente juntou seu dinheirinho e comprou uma casinha sabe o valor que ela tem. Assim também aquele que comprou os móveis para sua cozinha, sabe o valor que eles têm. Cada um tem seu jeitinho de arrumar a casa. Fato é que às vezes temos jeito e não temos dinheiro. Quem não quer uma casa jeitosinha para morar e namorar?

Alguns moram em casa com telhado de ponta, outros em prédios quadrados, porém quando se está dentro, o formato é sempre o mesmo: de ninho (feito os passarinhos).

Cada um arruma o ninho do seu jeito. Uns arrumam logo cedo, antes de sair para o trabalho; outros deixam tudo como está, na hora de ir e de voltar; há os que mudam tudo de lugar, para a energia melhorar; e há também aqueles sem tempo nem de pensar, quanto mais de organizar (ou, nem tanto ao céu, nem tanto ao mar).

Alguns moram em lugares pequenos, porém pintados de azul-capricho com uma flor desenhada na porta; dormem apertados num mesmo quarto, não sentem frio, nem distanciamento dos seres (sabem que o mundo está aí para ser compartilhado). Outros nascem em quarto enorme só para si. Como preencher tanto espaço vazio? Será que o vazio de fora é igual ao vazio de dentro? (Vazio veludo ou velado?).

Meninos de sorte nascem perto de bosques, onde há bicicletas, estilingues e bolas. Meninas, onde há bonecas, árvores e rodas. Bom é quando meninos e meninas compartilham os brinquedos.Quem tem sorte nasce perto dos avós em casa com varanda e perfume de rosas. Se tiver mais sorte, onde há vacas leiteiras olhando quando você passa rente ao rio de águas cristalinas. Um Pasto para jogar bola com os sonhos ainda frescos e possíveis (quem não gostaria?), inclusive de ser um Pelé ou Garrincha.

Uma casa de sorte fica próxima de flores e pássaros, de velhos e crianças, de doces em forno a lenha, de mulheres rendeiras, das bananeiras (bashôs) na beira do rio, ou das goiabas, araçás e ameixas (ame-as ou deixe-as / Leminski).

Na cozinha da casa, há quem areie as panelas até luzirem feito espelho e quem cozinhe com amor e esmero; outros são tão práticos que utilizam apenas uma panela ou tacho. Café solúvel ou cheiroso de deixar os vizinhos com água na boca? O jeitinho que cada um tem de fazer as coisas, começar o dia, lavar o rosto, abrir a janela, espiar um passarinho cantando, aspirar o perfume de um jasmim, ou, observar o pé de camélia florir.

Aqui do terceiro andar o que vejo são lembranças. A novidade é uma cozinha usada que ganhei. Fico imaginado as festas, as comidas deliciosas, os momentos felizes, as conversas... Sim, uma cozinha é como um livro, tem uma história para nos contar. Nenhuma cozinha nova faria minha casa mais feliz. Estamos todos felizes: os passarinhos cantam, os pratos dançam com as xícaras e a vassoura varre sozinha.

Crônica publicada no Caderno Anexo (Jornal A Notícia - 14/05/2007)

sexta-feira, 4 de maio de 2007

Convite

Estarei autografando o

Borboletras: poemas curtos que voam

na Feira de Rua do Livro de Florianópolis
dia 08 de maio, das 19 às 20 horas
Largo da Alfândega - Florianópolis - SC