segunda-feira, 23 de julho de 2007

Liberdade

E se um dia algum leitor reclamar do meu texto? Quem sabe ele me ache uma boba, uma dessas mulheres sonhadoras, daquelas que escrevem sobre amor quando poderiam estar tratando de assuntos importantes. Se isso acontecesse, pediria ao meu interlocutor que fosse mais específico e indicasse um assunto sobre o qual pudesse escrever e, quem sabe assim, agradá-lo. Mas diria a ele que não esperasse de mim uma escrita diferente daquela que sei fazer, porque quando se tenta escrever como os outros escrevem fica uma coisa meio chata de se ler. Percebe-se logo uma escrita forçada, ou sem alma, ou sem vontade, ou sem inspiração.

O diacho da crônica é que não dá para deixar lá no canto, ou na gaveta, por dias e meses para depois verificar se aquilo que escrevemos tem valor. A crônica é a escrita instantânea, com prazo certo (o do jornal). Não, não tenho do que reclamar. Tenho (sinto) admiração pelos escritores que escreveram antes de mim em máquinas manuais, sem a ferramenta do computador ou da internet (há muitos anos recortei uma crônica do Salim Miguel daqui deste caderno e a guardo com imenso carinho). Quanto mais escrevo, mais admiro os que me antecederam.

Por isso, caro leitor, tenha paciência. Daqui mais um tempo, quem sabe, eu chego lá, naquele lugar que nem sei onde fica, mas que presumo, exista. Daí sim, vou poder falar do canto do sabiá, das flores dos manacás, do céu azul todo anil, dos pássaros voando em mil. Tenha paciência. Assim também farei eu, deste lado do papel (ou da tela), serei paciente. Não pense que não existe uma angústia latente só porque a crônica é de vida curta, apenas um dia e lá se foi o momento do texto. Sim, existe a angústia de agradar, de fazer melhor, de fazer sorrir, de fazer chorar, enfim, a tentativa de compartilhar.

E, além de paciência, tenha compreensão por este (ou esta) que vos escreve com a melhor das intenções e nem sempre acerta. Este que sente, que é real ou implícito, que se diverte na hora de compor o texto, mas também chora. Este que se preocupa com os leitores, com as medidas, com as palavras ditas, para que os do outro lado, do outro mundo, sintam-se melhores, tocados, ou não. Algum poder por trás do texto há de tocar alguém um dia. Então haverá sol sobre o jornal aberto no banco do jardim, além do perfume de manacás.

Toda essa distância que existe entre nós desaparece se, por um átimo de segundo, você (leitor) retoma o texto para si. Se isso acontece, e ainda acontece, é porque existem leitores e jornais e escritores. A essa distância eu chamo liberdade, minha e sua. E liberdade não tem preço, caro leitor, é o bem supremo. Por isso o prazer do texto e da leitura, para nos libertarmos. Daí a importância de fugir de modelos prontos que já tiveram seu auge. Ou de escrever para um leitor hipotético imaginário